O Pará teve baixa adesão à pesquisa: apenas 11 participaram. Há 20 anos, lei prevê o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas
Paulo Chiari/EPTV
Oito em dez Secretarias Municipais de Educação da região Norte do Brasil realizam pouca ou nenhuma ação para cumprir a Lei 10.639/03, promulgada há 20 anos, e que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas públicas e privadas. Os dados foram revelados por levantamento realizado pela realizada por Geledés Instituto da Mulher Negra e pelo Instituto Alana, divulgado no mês em que é celebrado o Dia da Consciência Negra, esta segunda-feira (20).
O levantamento ocorreu por meio de uma análise regional sobre a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira, com 1.187 Secretarias Municipais de Educação em todo o Brasil, o que corresponde a 21% dos municípios do país.
Esses dados da região Norte são ainda mais preocupantes que a média nacional, em que 71% das secretarias organizam pouca ou nenhuma ação ligadas ao tema. O Norte foi a região do país com menor participação no estudo: 114 secretarias, apenas 10% do total de respondentes. Ou seja, 90% não deu retorno com as respostas solicitadas na pesquisa. Uma falta de participação que deixa sem respostas a realidade sobre a aplicação de uma das mais relevantes medidas antirracistas na educação brasileira.
O Pará teve baixa adesão à pesquisa: apenas 11 participaram. Destes, 64% realizam ações consistentes para implementar a Lei 10.639/03, 82% têm currículo adaptado e 73% disponibilizam recursos para a aplicação da lei.
A pesquisa mostra, também, que a maioria das ações realizadas por secretarias desses estados para apoiar as escolas no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira são orientações sobre medidas a serem tomadas em casos de racismo e oferecimento de apoio para a realização de atividades culturais e oficinas.
A percepção dos municípios respondentes sobre os desafios para a implementação da lei é a de que há ausência de apoio de governos, organizações e empresas, além da dificuldade dos gestores e profissionais em transpor o que está previsto nos currículos para os projetos das escolas.
Outro desafio identificado na região está no alocamento de recursos específicos para o cumprimento da lei. Ainda que cerca de 40% do território nacional realize investimentos e disponibilize recursos financeiros, apenas 8% das secretarias do Brasil e 2% do Norte possuem orçamento específico para implementá-la.
“A Lei 10.639/03 é a principal ferramenta para combater o racismo e para construir uma perspectiva positiva sobre as contribuições da população africana e afro-brasileira na nossa história e cultura, o que contribui para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária”, comenta Beatriz Benedito, analista de políticas públicas do Instituto Alana.
“Nesse sentido, governos, sociedade e escolas devem unir esforços para realizar ações de fortalecimento da administração pública, com o uso de indicadores de raça e cor para formulação e monitoramento de políticas educacionais, como também para a formação de professores e a escolha de materiais didáticos adequados. É um processo que demanda tempo e esforço imediato desses diferentes atores”.
Conheça a metodologia do estudo
A pesquisa “Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira” foi desenvolvida em duas etapas: quantitativa e qualitativa. Em abril de 2023, foram publicados os resultados da etapa quantitativa.
Os dados desta etapa foram coletados por meio de um formulário de auto preenchimento voluntário, respondido pelas secretarias ao longo de 2022. Participaram 1.187 Secretarias Municipais de Educação, ou seja, 21% de todos os municípios brasileiros, com respondentes nas cinco regiões do país.
Foram verificadas como e se as secretarias respondentes construíram condições para combater o racismo estrutural, quais os passos percorridos, as lacunas existentes e os desafios que compõem o grave cenário da implementação da Lei 10.639/03 nas redes municipais de ensino, principais responsáveis pela educação básica do país. A etapa qualitativa, que investiga a aplicação prática da lei sobre história e cultura afro-brasileira em seis municípios, será divulgada em novembro de 2023.
“Nós esperamos que este estudo contribua para a discussão sobre como a intencionalidade de organização das secretarias para induzir e fortalecer a implementação da lei, por meio do planejamento articulado e contínuo, impacta a atuação das redes escolares no combate ao racismo”, diz Tânia Portella, representante do Geledés.
“Se colocada em prática, a lei pode impactar a vida de todos os estudantes e profissionais da educação, ao trazer referências que dialogam com os saberes de todos os povos e realidades, promovendo mudanças de percepções e comportamentos nas pessoas. Impacta a comunidade escolar, o entorno e com o tempo, se deseja alcançar um conjunto mais amplo da sociedade a partir do conhecimento, reconhecimento e valorização de realidades e abordagens que foram invisibilizadas ao longo da história brasileira”, finaliza.
A pesquisa é uma iniciativa conjunta de Geledés e Alana, encomendada à Plano CDE, recebeu o apoio da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme) e da Imaginable Futures.
No Norte, 80% das cidades não implementam ensino de História e Cultura Afro-Brasileira, aponta estudo
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