Caro (a) leitor (a)
Quando foi que envelhecer virou luxo? Envelhecimento é um tema potente, sensível, extremamente relevante — com muito potencial para gerar conexão e reflexão. Não acha?
Imagine a cena: um café parisiense, mesas na calçada, e ali estão elas —Carrie Bradshaw (personagem principal da série Sex and The City) e Simone de Beauvoir (filósofa, escritora e ativista francesa), duas mulheres de mundos diferentes, unidas por uma inquietação comum.
Entre goles de expresso e olhares atentos ao movimento da rua, surge a pergunta que move a conversa: “Será que estamos mesmo preparados para viver mais… ou apenas obcecado sem parecer mais jovens?”
Carrie, com seu olhar aguçado para as nuances do cotidiano, aponta para o paradoxo: nunca se falou tanto em longevidade, bem-estar e autocuidado — e, ao mesmo tempo, nunca estivemos tão pressionados a esconder os sinais do tempo. Como se viver fosse permitido, desde que não se note.
Simone, por sua vez, relembra que a sociedade ainda é cruel com quem envelhece. O etarismo, sutil ou escancarado, está nas piadas, nas demissões silenciosas, nas vitrines que ignoram corpos que já viveram mais da metade de uma vida. Está nos aplicativos que não pensam em acessibilidade e nos algoritmos que só entregam relevância a rostos lisos e vozes jovens.
Envelhecer: O tempo vivido não é peso, é potência – Foto: Pexel/ND
Juntas, elas concordam: envelhecer em paz, com saúde, dignidade e pertencimento, deveria ser o mínimo. Mas ainda é o máximo que muitos não alcançam.
Confesso que o envelhecer “me incomoda”. Apaixonada pela vida como sou, a ideia de que, fazendo um cálculo básico, metade dela já se foi, me dá um certo desconforto.
Enquanto Carrie lembra das amigas que se sentem invisíveis após os 50, Simone fala sobre como o capitalismo nos condiciona a valorizar apenas aquilo que produz, consome e performa. E aí o que se perde é justamente o que mais importa: a experiência, o tempo vivido, as histórias que moldam quem somos.
Vivemos a contradição de uma era em que podemos viver mais, mas não sabemos muito bem o que fazer com essa dádiva. Cultuamos a juventude como se ela fosse eterna — e, quando não for mais possível mantê-la, escondemos, silenciamos, substituímos.
Mas talvez, como diria Simone, “o importante não é aquilo que a vida fez de nós, mas o que nós fazemos com o que a vida fez da gente.” Lembro que minha mãe, aos 42 anos, era vista — e se via — como uma“senhora”. Hoje, aos 70 e poucos, muitas vezes parece mais jovem do que era naquela época. Tem mais brilho no olhar, mais sede de mundo.
E quando penso na tal metade da vida que já passou, lembro que minha primeira meia maratona aconteceu aos 46. Vinte e um quilômetros de superação. O corpo gritou, sim. Mas gritou junto a endorfina e a alegria de me sentir viva.
Foi ali que entendi que o tempo vivido não é peso — é potência. E talvez esteja aí a provocação que deixo pra mim e pra você: Será que não está na hora de valorizarmos não quem parece mais jovem, mas quem viveu o suficiente para ensinar a dançar com o tempo?
Envelhecer não deveria ser um privilégio.
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