Greve da Receita chega a 180 dias neste sábado (24) – Foto: Pillar Pedreira/Agência Senado
A greve da Receita Federal chega neste sábado (24) a 180 dias, afetando diretamente a arrecadação do governo e o comércio exterior. Iniciada em 24 de novembro de 2024, a paralisação dos auditores-fiscais já causou prejuízos bilionários e foi apontada nesta semana pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), como um dos fatores que contribuíram para a necessidade de contingenciamento do Orçamento de 2025.
Durante coletiva sobre o Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do 2º Bimestre, Haddad reconheceu os efeitos da greve da Receita nas contas públicas. Outros fatores citados por ele foram a ausência de compensação para a desoneração da folha de pagamento e a taxa de juros acima do previsto.
“O segundo problema, que é um fato, não estou entrando no mérito, é a paralisação da Receita Federal. Nós estamos com a Receita em greve. Isso afeta o desempenho da arrecadação e isso traz consequências que estão sendo avaliadas por nós”, comentou o ministro da Fazenda.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante divulgação dos dados do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 2º bimestre de 2025 – Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Prejuízos bilionários da greve da Receita Federal
A greve da Receita suspendeu atividades essenciais, como fiscalização, auditorias e liberação de cargas, o que impactou diretamente a arrecadação de tributos como Imposto de Renda, IPI, PIS e Cofins. Em portos e fronteiras, o atraso na liberação de mercadorias reduziu a arrecadação com impostos de importação e causou transtornos ao comércio exterior.
Um dos momentos mais críticos foi a operação “Desembaraço Zero”, que paralisou a liberação de mercadorias nas aduanas por 12 dias em abril. Antes disso, entre 12 e 27 de fevereiro, outra paralisação semelhante causou perdas estimadas em R$ 14,6 bilhões, segundo o Sindifisco Nacional. O Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) chegou a emitir nota pedindo o fim da greve da Receita. “Empresas enfrentam custos operacionais mais altos, perda de competitividade e risco de desabastecimento”, alertou a entidade.
Impacto no Carf e nos acordos de dívidas
A greve da Receita também paralisou o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão que analisa disputas entre a Receita e os contribuintes sobre cobranças de impostos. Desde janeiro, não há sessões no órgão, interrompendo a análise de processos que somam bilhões de reais em valores contestados.
Greve da Receita impactou atividades do Carf – Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Além disso, a equipe da Receita responsável pela negociação de dívidas de grandes contribuintes tem aproximadamente R$14,6 bilhões em acordos parados, aguardando o fim da greve da Receita para conclusão. Segundo o Sindifisco, esse valor poderia quase triplicar a arrecadação com as transações tributárias diretas — ferramenta usada para regularizar débitos fiscais.
A greve da Receita também atrasou o lançamento do programa pré-preenchido do Imposto de Renda e a liberação das restituições. Esses atrasos impactam o cumprimento da meta da Lei Orçamentária Anual (LOA), que previa arrecadar R$ 28,6 bilhões por meio de decisões no Carf.
Motivos da greve
Os auditores fiscais reivindicam a recomposição do salário básico, congelado desde 2016, e a regulamentação do bônus de eficiência. Durante a greve, o Sindifisco Nacional criticou mudanças unilaterais feitas pela Receita nas regras do bônus, sem consulta ao sindicato, o que acirrou ainda mais a insatisfação.
Segundo o sindicato, cerca de metade dos auditores aderiu à greve. Já os que atuam na fiscalização aduaneira, impedidos legalmente de parar, adotaram operação padrão, o que causa atrasos na liberação de cargas, como nas ações do “Desembaraço Zero”.
Críticas à gestão da Receita
A condução da alta administração da Receita Federal também é alvo de críticas. O secretário Robinson Barreirinhas foi alvo de moção de desconfiança do Sindifisco após a publicação das Resoluções nº 7 e nº 8, que alteraram o funcionamento do programa de produtividade. A entidade argumenta que o bônus de produtividade, idealizado como incentivo à eficiência, se tornou uma punição financeira durante a greve.
Secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas – Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Além disso, o sindicato critica a exclusão da categoria das propostas de recomposição salarial para 2025-2026. A ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, também foi mencionada em nota de repúdio, que classificou sua atuação como “inflexível” e “antidemocrática”.
Negociações em andamento
Depois de meses de pressão, o governo e os auditores se reuniram em 15 de maio. No entanto, a proposta apresentada pelo Ministério da Gestão e Inovação (MGI) foi considerada insuficiente pela categoria, pois não levava em conta as especificidades da carreira.
Na última quinta-feira (22), em novo encontro, o governo apresentou outra proposta, que será discutida na Assembleia Geral dos auditores nesta segunda-feira (26). Apesar do avanço no diálogo, lideranças da categoria afirmam que o conteúdo está “muito aquém do esperado”.