Por que Fapesp quer R$ 5,3 milhões de volta de cientistas da Unicamp após desvio atribuído a ex-funcionária


Ao todo, 34 pesquisadores foram acionados na Justiça. Ex-servidora da Funcamp apontada como responsável pelos desvios saiu do país um mês após caso vir à tona em 2024. Vista aérea da Unicamp, em Campinas
Antoninho Perri/Ascom/Unicamp
Ainda que não sejam apontados como responsáveis diretos pelo desvio milionário de verbas de pesquisa na Unicamp, 34 cientistas da universidade foram acionados na Justiça para devolver R$ 5,3 milhões à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Isso porque, para a Fapesp, os pesquisadores falharam em monitorar o uso dos recursos, permitindo o acesso indevido de uma ex-servidora da Fundação de Desenvolvimento da Unicamp (Funcamp), ligada ao Instituto de Biologia (IB), às contas bancárias dos projetos.
“No entender da Fapesp, os pesquisadores responsáveis pelas pesquisas contribuíram culposamente para esses desvios, já que franquearam, indevidamente, o acesso de terceiros às contas bancárias vinculadas aos projetos”, disse a fundação em nota enviada ao g1.
A ex-servidora investigada, Ligiane Marinho de Ávila, de 36 anos, deixou o Brasil em 19 de fevereiro de 2024, um mês após os desvios serem descobertos. Em setembro, o Ministério Público pediu a prisão preventiva e a quebra do sigilo bancário dela. Leia mais abaixo.
Como aconteceu o desvio?
Ligiane, à época servidora da Funcamp, era responsável por ajudar na gestão das verbas dos projetos de pesquisa do IB.
Segundo a Fapesp, ela emitiu e pagou notas fiscais falsas, utilizando uma microempresa no nome dela, além de ter feito transferências bancárias para a conta pessoal.
Ao todo, a suspeita é que ela tenha feito cerca 220 transferências bancárias. Parte dos desvios também envolveu outras três pessoas jurídicas.
O relatório final da Fapesp apontou que o desvio total de recursos foi de R$ 5.384.215,88, entre 2013 e 2024.
Desse total, R$ 5.077.075,88 foram desviados por meio das contas bancárias de Ligiane.
Ligiane Marinho de Ávila, investigada pela Polícia Civil por suspeita de desviar verbas de pesquisa da Unicamp
Reprodução/EPTV
Pesquisadores condenados
Entre os casos já julgados, segundo a Fapesp, três pesquisadores foram condenados a devolver valores que variam entre R$ 31 mil e R$ 243 mil. Dois outros docentes escolheram fazer o ressarcimento pela via administrativa, somando R$ 38,2 mil.
A fundação destacou ainda que as ações judiciais tramitam na 1ª, 2ª e 3ª Varas da Fazenda Pública de Campinas e também na capital paulista, sendo a maioria delas ainda analisada na fase de instrução processual.
Entenda suspeita de desvio milionário de verbas de pesquisa da Fapesp na Unicamp
Investigação
O caso foi investigado pelo 7º Distrito Policial de Campinas. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública informou que a ex-servidora foi indiciada indiretamente pelo crime de peculato. O inquérito policial foi concluído e encaminhado à Justiça no dia 22 de agosto de 2024.
🔎 Conforme o artigo 312 do Código Penal, peculato é o crime em que um funcionário público desvia ou se apropria de bens públicos ou privados que estão sob sua responsabilidade. A pena varia de 2 a 12 anos de reclusão.
Em setembro do ano passado, logo após a conclusão do inquérito, o Ministério Público Estadual (MP-SP) pediu à Justiça a prisão preventiva e a quebra de sigilo bancário da ex-funcionária da Funcamp.
A Promotoria de Justiça afirmou no pedido que a prisão de Ligiane era necessária uma vez que ela, ao sair do país, tentou se esconder para não responder pelos fatos pelos quais foi indiciada.
O g1 solicitou posicionamentos atualizados ao Ministério Público, à Unicamp, à Funcamp e à defesa de Ligiane Marinho de Ávila, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem. Assim que os citados se manifestarem, o texto será atualizado.
O que diz a Fapesp
“A FAPESP constatou irregularidades na prestação de contas de projetos de pesquisa fomentados pela FUNCAMP/Unicamp e desenvolvidos no Instituto de Biologia da UNICAMP.
Analisando a prestação de contas de um projeto específico, constatou-se que as mesmas incongruências se repetiam em outros projetos de pesquisa ali sediados.
Essas incongruências eram indicativas de desvios de recursos públicos concedidos pela FAPESP, praticados dolosamente por uma empregada do Escritório de Apoio vinculado à FUNCAMP/UNICAMP, e ocorriam por meio da emissão e pagamento de notas fiscais fraudulentas emitidas por microempresa de sua titularidade, além de transferências bancárias para sua conta pessoal.
No entender da FAPESP, os pesquisadores responsáveis pelas pesquisas contribuíram culposamente para esses desvios, já que franquearam, indevidamente, o acesso de terceiros às contas bancárias vinculadas aos projetos.
A FAPESP ajuizou ações de cobrança contra todos os pesquisadores responsáveis por projetos em que se verificaram desvios, em um total de 34 ações.
Essas ações estão tramitando junto à 1ª, 2a e 3a Vara da Fazenda Pública da Comarca de Campinas e também em São Paulo – Capital, com a maioria delas ainda em fase de instrução processual.
Nos três casos judiciais em que houve decisão favorável, os pesquisadores foram condenados a devolver, respectivamente, R$ 43.924,74, R$31.255,97 e R$ 242.782,19, acrescidos de correção monetária e juros moratórios.
​Há, também, casos de dois pesquisadores que optaram por realizar o ressarcimento pela via administrativa, que somados totalizam R$38.229,20. Tais valores já foram devolvidos.
O relatório final da apuração sobre o caso concluiu que o potencial desvio total de recursos foi de R$5.384.215,88, ocorridos entre 2013 e 2024. Desse valor, R$ 5.077.075,88 foram desviados através de contas bancárias de Ligiane Marinho, ex-empregada da FUNCAMP, e o restante por meio de contas vinculadas a três pessoas jurídicas.
Cumpre registrar ainda que, no âmbito de suas atribuições próprias, o Ministério Público de São Paulo está investigando o caso por meio de Inquérito Civil e também por meio de procedimento criminal”.
O que diz a Unicamp
“A Unicamp está acompanhando e colaborando com o Ministério Público nas investigações que estão sendo feitas.
A universidade concluiu a sindicância aberta para apuração dos fatos, tendo decidido pelo arquivamento do processo, uma vez que os prejuízos financeiros estão sendo suportados pelos docentes junto à Fapesp, podendo, no entanto, reabrir as investigações internas, se novos elementos forem apresentados.
Internamente, a Unicamp está preparando normativa para disciplinar o apoio aos docentes que recebem diretamente recursos para pesquisa de agências de fomento, de acordo com as regras e diretrizes dessas agências, em especial da FAPESP”.
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