
Moradores de Parchment, uma cidade no estado do Michigan (EUA), ainda carregam no sangue substâncias tóxicas liberadas por uma fábrica de papel fechada em 2000
A fábrica, chamada Kalamazoo Vegetable Parchment Company, operou por quase um século e usava químicos para impermeabilizar embalagens de alimentos.
Os resíduos eram jogados em um aterro, que contaminou o solo e a água da região.
Em 2018, exames revelaram que a água potável da cidade estava com níveis alarmantes de PFAS — substâncias artificiais ligadas a câncer e doenças graves.
A situação foi tão crítica que o governo declarou emergência e cortou o abastecimento público, recorrendo a outras fontes.

Risco invisível no sangue
Mesmo após a troca da água, exames de sangue feitos em moradores em 2022 mostraram que 100% das pessoas testadas tinham dois tipos de PFAS no organismo: PFOA e PFOS.
Esses químicos, apelidados de “eternos” porque não se desfazem na natureza, continuaram no corpo dos moradores por anos.
Em 2021, as empresas 3M e Georgia-Pacific, acusadas de produzir os químicos, pagaram US$ 11,9 milhões (cerca de R$ 61,5 milhões na cotação atual) para resolver processos judiciais.
A pesquisa, feita pela Universidade Estadual de Michigan, mostrou que quem bebeu água da rede pública contaminada por mais tempo teve níveis mais altos de PFAS no sangue. “A água foi a principal fonte de exposição”, afirma o estudo.
Água e poços ainda preocupam
Apesar da mudança no abastecimento, testes em 2022 ainda encontraram PFAS na água pública de Parchment. Poços particulares, usados por parte da população, também estavam contaminados antes de 2018.
Os pesquisadores analisaram 80 moradores: 39, que bebiam água da cidade apresentaram alta exposição, e 41, que usavam poços, tiveram baixa exposição.
Quanto mais anos a pessoa consumiu água contaminada, maior a concentração de PFAS no sangue. “Esses químicos ficam no corpo por décadas”, explica Rainer Lohmann, especialista da Universidade de Rhode Island.

PFAS: um problema global
Os PFAS não são um problema só em Parchment. Esses químicos foram usados por décadas em produtos como panelas antiaderentes, roupas impermeáveis e espumas de combate a incêndios.
Um relatório de 2022 mostrou que 83% dos rios e lagos dos EUA têm PFAS.
Governos mundiais estão correndo para controlar o uso dessas substâncias.
Nos EUA, uma lei federal exige que, até 2029, os sistemas de água pública reduzam os níveis de PFAS, mas há preocupação de que futuros governos relaxem as regras.

Alerta para outras cidades
Cientistas alertam que a situação de Parchment pode se repetir em outras regiões.
“Aterros antigos e fábricas abandonadas são bombas-relógio”, diz Heather Stapleton, coautora do estudo e professora da Duke University. “Monitorar a água potável é essencial para evitar novos desastres”, conta.
O estudo também serve de alerta: mesmo após limpar a fonte de contaminação, os químicos persistem no ambiente e no corpo humano por anos.
Além de pressionar por leis mais rígidas, pesquisadores querem acompanhar a saúde dos moradores de Parchment a longo prazo. “Precisamos entender como esses químicos afetam o corpo após anos de exposição”, diz o estudo.