
Experimento com espécie tropical da Índia revela limites e potencial da adaptação animal a extremos de temperatura. Aquecimento global: cientistas induzem adaptação térmica em peixes tropicais
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Por meio de seleção artificial, cientistas conseguiram ampliar, em laboratório, a tolerância térmica de peixes-zebra. O experimento em laboratório, liderado pela Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU), ajuda a entender como algumas espécies podem responder — ainda que de forma limitada — ao aquecimento global.
Para chegar a esses resultados, os pesquisadores analisaram o comportamento dos peixes ao longo de sete gerações criadas em cativeiro. A escolha por analisar essa espécie está relacionada com aspectos geográficos e morfológicos.
Por ser um peixe tropical que habita águas rasas e quentes, o peixe-zebra pode estar entre as espécies mais suscetíveis à extinção causada pelas mudanças climáticas, pois as temperaturas ambientais podem exceder rapidamente seus limites fisiológicos.
Peixe-zebra utilizado por pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU)
Oregon State University
Além disso, eles são bons candidatos para análises em laboratório devido ao curto espaço de tempo necessário para que eles se reproduzam e contribuam com novas gerações de animais para pesquisa.
Como a pesquisa foi realizada
Primeiro, foram coletados quase 400 peixes da região de Bengala Ocidental, na Índia. Após a retirada da primeira geração de peixes-zebras na natureza, foi realizada uma seleção artificial ao longo de sete gerações para aumentar ou diminuir o limite de tolerância térmica dos animais.
A cada nova geração nascida em laboratório, 450 peixes eram escolhidos e divididos no que eles chamaram de Linhas de Seleção.
Isso quer dizer que os peixes eram avaliados da seguinte forma:
Linha de seleção para cima: 150 animais com os maiores limites térmicos foram cruzados para formar a próxima geração;
Linha de seleção para baixo: 150 animais com os menores limites térmicos foram cruzados;
Linha de controle: composta por peixes escolhidos aleatoriamente, sem critério térmico, e usada como comparação.
Após finalizado os testes, foram analisadas as seguintes características em cada uma das sete gerações seguintes criadas em laboratório:
Capacidade de reprodução;
Crescimento;
Taxas metabólicas em temperaturas entre 28°C e 34°C;
Velocidade de natação máxima em temperaturas entre 28°C e 34°C;
Preferência por temperatura em temperaturas entre 22°C a 35°C;
Resultados e implicações
Os peixes da linha selecionada para maior tolerância ao calor apresentaram um aumento de até 0,22 °C no limite térmico superior (CTmax). De forma inesperada, também houve um ganho de até 0,35 °C na tolerância ao frio (CTmin). No total, a faixa de temperatura que esses peixes conseguiram tolerar se ampliou em até 0,6 °C.
Essa ampliação da janela térmica pode ser relevante em contextos de extremos climáticos sazonais. No entanto, os autores destacam que a seleção artificial ocorreu em ambiente controlado, com alimentação garantida e temperatura constante — condições que não refletem a realidade dos ecossistemas naturais.
(VALE NOTAR: Atualmente, a influência humana é responsável por alta de 1,09°C na temperatura global em relação ao período pré-revolução industrial (1850–1900), estima relatório do IPCC. A estimativa mais recente é de que enfrentamos, até aqui, um aumento de 0,2ºC por década.)
Risco do aquecimento global persiste
Os cientistas alertam que, apesar de os resultados demonstrarem um potencial evolutivo para tolerância ao calor, esse processo ocorre de forma lenta e provavelmente não será suficiente para acompanhar a velocidade do aquecimento global.
Peixes tropicais como o zebrafish continuam entre os grupos mais vulneráveis a eventos extremos, como ondas de calor. A pesquisa ajuda a esclarecer os limites biológicos da adaptação animal às mudanças climáticas — e mostra que nem sempre a evolução consegue manter o ritmo da crise.
No entanto, os pesquisadores alertam que as condições controladas do laboratório de pesquisa (temperatura constante e alimentação) pode mascarar adversidades ao processo evolutivo e que, na natureza, essa evolução diante de temperaturas extremas pode ser mais lenta e não seja suficiente para mitigar completamente os impactos do rápido aquecimento global.
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