Dancinha de professor e discussões acaloradas: saiba o que rolou na polêmica reunião da UFSC

Professor Alex Degan faz dancinha polêmia durante sessão da Conselho Universitário sobre o nome de João David Ferreira Lima no campus da UFSC – Foto: Divulgação/ND
Uma nova sessão do Conselho Universitário da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) para definir sobre a mudança do nome do campus de Florianópolis deve ocorrer nesta sexta-feira (13).
Mesmo assim, a reunião da última sexta-feira (6) segue repercutindo: terminou em confusão, teve discussões acaloradas e trocas de provocações entre membros da comunidade acadêmica e políticos que participaram do encontro.

Uma das situações que causou revolta está relacionada à advogada da família do fundador e primeiro reitor da UFSC, João David Ferreira Lima, Heloisa Ferro Blasi Rodrigues, que teve seu tempo de defesa reduzido a cinco minutos.
Esta seria a primeira vez que Heloisa iria se manifestar para trazer provas e argumentos em favor da impugnação ao relatório da comissão da verdade. “Na hora em que o tempo foi reduzido para fazer a sustentação oral, pedi que fosse lavrado em ata o flagrante cerceamento de defesa”, explica.
Heloisa ressaltou que a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) deve se manifestar sobre o caso no qual a advogada não pode exercer seu trabalho, e que o diretor de Prerrogativas e Valorização da Advocacia, Rui Voltolini, tomará as devidas providências oportunamente.
Com relação aos debates e à votação para retirar a homenagem à Ferreira Lima, Heloisa enaltece que “não haverá dancinha debochada ou mentiras repetidas mil vezes que possam se sobrepor à verdade histórica, às nossas provas e argumentos.”
Dancinha e desrespeito
A advogada relembra que no momento em que o reitor sugeriu e levou à votação a redução do seu tempo de fala, o professor Alex Degan, conselheiro universitário, fez uma coreografia como resposta às provocações – e foi aplaudido.
“Quando venceram, ele iniciou o ‘show’. Uma forma desrespeitosa, inoportuna e provocativa de dizer que ali quem manda são eles. E pior, tudo com a aquiescência e risos da mesa que presidia os trabalhos, nas pessoas do reitor e da vice-reitora. Uma tristeza ver o fundo do poço onde a nossa UFSC chegou”, reitera Heloisa.
Para ela, “a falta de urbanidade do servidor público federal em seu ambiente de trabalho é visível e flagrante.”
Sessão do Conselho Universitário da UFSC sobre Ferreira Lima foi marcada por polêmicas – Foto: Divulgação/ND
Ferreira Lima também era fichado no SNI
Segundo Heloisa, na época da ditadura, ninguém estava livre das pressões, das fiscalizações e cobranças dos militares no poder.
“Dr. David sempre foi respeitado. E nessa condição preservou a UFSC de ocorrências graves, como aconteceu em outras universidades no Brasil. Por causa disso, também era fichado no SNI (Serviço Nacional de Informações)”, ressalta.
A advogada diz ainda que Florianópolis era uma cidade muito pequena e que as pessoas se conheciam e se protegiam mutuamente.
“Há muitos exemplos disso. Tenho declarações de pessoas que a CMV/UFSC disse que foram perseguidas pelo primeiro reitor, as quais negam veementemente essa condição”, revela.
“É muito importante que a sociedade civil acompanhe os acontecimentos dentro da UFSC. Ela sobrevive com os nossos tributos. Apesar da autonomia didática, administrativa e financeira que detém, por força da Constituição Federal de 1988, ela não pode deixar de cumprir a lei e observar o ordenamento legal”, reitera Heloisa.
UFSC diz que direito à manifestação foi respeitado
Em nota enviada ao Grupo ND, a universidade afirmou que a sessão do Conselho Universitário foi aberta ao público para garantir transparência no processo de análise das recomendações da Comissão da Memória e Verdade, aprovadas em 2018.
Segundo a instituição, a presença de um grande número de participantes, incluindo pessoas externas à comunidade acadêmica, resultou em provocações e momentos de tensão durante a reunião.
Ainda assim, a UFSC informou que o direito à manifestação foi respeitado, conforme o regimento interno.
A universidade destacou que a abertura das sessões reforça o compromisso com a transparência, mas exige comportamento respeitoso por parte de todos os presentes.
Discussão sobre Ferreira Lima ocorre há anos
A Comissão Memória e Verdade da UFSC recomendou que a universidade tome medidas para reparar os danos causados pela ditadura militar. Entre os pedidos, o relatório sugere que sejam retiradas as homenagens ao ex-reitor, que teria perseguido estudantes, professores e servidores no período.
Uma pesquisa aponta, no entanto, que a história de João David Ferreira Lima não era exatamente como descrito no relatório da comissão. O livro “UFSC: em Nome da Verdade”, escrito pela advogada Heloisa Blasi e lançado em 2024, mostra supostos equívocos no relatório.
Durante a última sessão, a advogada e autora do livro diz que não conseguiu mostrar o contraditório às afirmações, que seriam levianas, baseadas em documentos descontextualizados.
“Nunca houve uma demissão de servidor, professor ou funcionário, ou expulsão de aluno que comprove as punições que eles dizem que houve na UFSC durante as sucessivas gestões do Dr. David.”
Depoimento de Marilda Machado Linhares
“Eu, Marilda Machado Linhares, OAB 0793, declaro que fiz parte da Comissão de Indenização aos ex-presos políticos detidos sob a acusação de terem participado de atividades políticas, entre 01/09/61 a 15/08/79, criada pela Lei 10.719, de 13/01/1998, através do ato 571, de 15/04/1998, do Governador Paulo Afonso Evangelista, que nomeou a referida comissão, sob a presidência do Dr. Genir Destri, com o intuito de avaliar e analisar os pedidos de indenização dos referidos presos, ouvindo-os ou suas testemunhas, dos quais foram deferidos 355 indenizações, AFIRMO que, dos inúmeros depoimentos e requerimentos dos ex-presos que analisei, ligados direta e indiretamente à UFSC, tais como alunos, funcionários e ex-professores, nenhum deles manifestou qualquer perseguição indicação ou participação do então Reitor, Dr. David Ferreira Lima que tenha dado ensejo à prisão. Fpolis, 02/06/2025.”
“A gente só quer falar a verdade”, garante família
Neto de João David Ferreira Lima, o administrador Gabriel Couto Ferreira Lima ainda está incrédulo com a situação vivida pela família nos últimos anos. Desde 2023 a advogada Heloisa Blasi fez a impugnação e não foi ouvida.
“Ela tem todos os documentos e arquivos que vão mostrar para o Conselho Universitário que tudo o que estão falando é uma mentira. Estão desvirtuando tudo o que tem relação com o meu avô. É tudo triste e parcial”, considera.
Segundo ele, estão querendo apagar uma história linda construída pelo avô, que recebeu 38 medalhas pelo Brasil e pelo mundo e era considerado referência em educação, e por todas as pessoas que viviam em volta dele.
“A questão, nesse caso, não é de vencedores ou perdedores. A questão é a verdade. Temos todos os documentos”, ressalta.
 “Triste e impotente”, desabafa neto de reitor
O neto do primeiro reitor da UFSC considera a situação da última sexta-feira (6) um circo.
“O que vi naquela reunião me deixou triste e impotente. Senti meu avô sendo injustiçado. Senti a falta de democracia”, revelou, considerando ainda a falta de respeito à profissional Heloisa, “uma mulher, profissional, sem defesa, com um monte de gente berrando”.
Até a reunião da próxima sexta-feira (13) ele espera reunir uma adesão ainda maior de entidades para mostrarem a força da causa.
“Vamos conversar com os conselheiros. Sabemos que muitos querem dizer não à retirada do nome, mas têm medo. Além disso, recebemos apoio do Floripa Sustentável, do prefeito Topázio Neto, da Alesc, da Câmara de Vereadores. Estamos indo para Brasília em busca dos direitos do meu avô”, reitera.


Alex Degan teria dançado após advogada que defende família Ferreira Lima ter seu tempo de fala reduzido – Vídeo: Divulgação/ND
Alex Degan fez dança como provocação
Alex Degan, conselheiro universitário, que dançou como forma de provocação, é pesquisador no Departamento de História da UFSC. Ele tem doutorado em história social pela USP (Universidade de São Paulo) e atua principalmente nas áreas de história antiga, cultura e história da Índia.
Como membro do conselho universitário e diretor do CFH (Centro de Filosofia e Ciências Humanas), o voto de Degan deve conduzir a votação para retirada do nome de Ferreira Lima do campus.
Em nota, ele disse que “trata-se de um vídeo que não dura mais do que alguns segundos, mas que está sendo propositalmente divulgado em câmera lenta e fora de contexto, com o intuito de atacar a universidade e o que ali se discutia”.
E que “enquanto eles bradavam ódio, minha intenção foi reagir com humor. Lamento se minha dança desajeitada tenha causado constrangimento aos meus colegas docentes, técnicos ou estudantes, razão pela qual ofereço meu sincero pedido de desculpas.”
Sessão do Conselho Universitário da UFSC sobre João David Ferreira Lima foi adiada devido liminar da justiça – Foto: Divulgação/ND
A sessão de sexta-feira (6) deveria ter ocorrido em 30 de maio, mas foi adiada após decisão judicial liminar, impetrada pela família Ferreira Lima contra a UFSC.
A liminar determinou que a universidade “se abstenha de deliberar ou praticar qualquer ato que importe na revogação das homenagens conferidas ao ex-reitor João David Ferreira Lima até que haja decisão expressa e definitiva do Conselho Universitário sobre a impugnação.”
Processo que revoga homenagem a Ferreira Lima mancha a reputação da universidade, diz Floripa Sustentável
Para o Floripa Sustentável, movimento apartidário criado em agosto de 2017 por entidades, empresas e pessoas que se uniram para debater ideias, fomentar soluções eficazes e projetar o futuro de Florianópolis com um crescer responsável, a rejeição da impugnação do processo que revoga a homenagem ao professor João David Ferreira Lima pelo Conselho Universitário, na última sexta-feira (6), é mais um ato lamentável que mancha a reputação da UFSC, arduamente construída ao longo de 65 anos.
“Mais do que isso, são lamentáveis também as cenas da sessão do conselho, que chegaram ao conhecimento da população pelas redes sociais e pelos veículos de comunicação. De parte das 45 entidades que integram o Floripa Sustentável, a luta continua e continuará mesmo depois da decisão a ser tomada na próxima sexta-feira (13)”, considera o coordenador geral da entidade, Roberto Costa.
“Se houver a retirada do nome, faremos todos os esforços para revogar essa medida absurda; se for mantido o nome do professor David Ferreira Lima, seremos ativos para evitar que eventuais novas tentativas nesse sentido obtenham sucesso”, finaliza.

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