Pessoas não pensam só na parte financeira. Elas são animais sociais com uma tendência a procurar razões ocultas por trás do comportamento de outras pessoas. Consumidores passam por uma loja com promoção em Londres, na Inglaterra.
Reuters
Se lhe oferecerem um biscoito grátis, você pode dizer sim. Mas se você for pago para comer um biscoito grátis, sua resposta seria a mesma?
Em nossa nova pesquisa, duas vezes mais pessoas estavam dispostas a comer um biscoito quando não lhes era oferecido pagamento, em comparação com quando recebiam oferta de remuneração para fazê-lo.
De uma perspectiva puramente econômica, nossas descobertas refletem uma tomada de decisão irracional. Objetivamente, um biscoito + dinheiro é melhor do que apenas um biscoito.
Mas as pessoas não pensam só na parte financeira. Elas são animais sociais com uma tendência a procurar razões ocultas por trás do comportamento de outras pessoas.
LEIA TAMBÉM
Cheque especial: quando usar e quando evitar a modalidade de crédito?
RANKING: Nem Messi, nem Neymar: veja quem é o jogador mais bem pago em 2024
Número de super-ricos dispara, e é preciso fortuna ainda maior para ser um ‘ultrarrico’
No caso de ofertas excessivamente generosas, esperam que haja um “custo fantasma” – algo escondido na oferta inicial. E essa expectativa influencia a decisão de aceitar algo ou não.
Os participantes da pesquisa que receberam um biscoito grátis e um pagamento adiconado pensaram que, talvez, os biscoitos estivessem envenenados. Ou, que alguém tenha cuspido neles. Ou, ainda, que ficariam devendo um favor à pessoa que distribuiu as guloseimas, assim que o biscoito fosse comido.
Bom demais para ser verdade
Nosso estudo com biscoitos foi apenas um dos dez experimentos envolvendo 4.205 participantes nos Estados Unidos e no Irã.
Testamos como os custos fantasmas influenciavam as escolhas das pessoas em aceitar ou rejeitar ofertas econômicas excessivamente generosas.
Cada pesquisa deu às pessoas uma oferta: decidir se aceitavam ou não, e explicar o porquê.
Uma delas pediu aos participantes que imaginassem que eram motoristas de caminhão e estavam procurando emprego online. Todos os empregos foram descritos da mesma forma, mas variamos o salário. Pessoas que receberam a oferta normal de US$ 15 por hora estavam perfeitamente dispostas a aceitar o emprego.
Outros receberam uma oferta maior do que o salário normal. Os participantes desse grupo imaginaram motivos ocultos em tal proposta. E quanto maior o salário oferecido, piores os motivos imaginados.
Quando oferecidos US$ 20 ou US$ 25 por hora, os participantes concluíram que a função deveria envolver mais responsabilidades ou trabalho mais árduo. Mas, consideraram que valia a pena. A maioria das pessoas preferia um emprego que pagasse um pouco mais do que o normal, apesar da expectativa de custos fantasmas.
No entanto, quando oferecemos muito dinheiro — mais de US$ 900 por hora — a maioria das pessoas rejeitava o trabalho que estavam dispostas a fazer por US$ 15.
Por quê? Eles imaginaram encargos ocultos muito piores: dirigir para a máfia, transportar resíduos radioativos perigosos ou contrabandear drogas pela fronteira. Uma taxa horária ou salário suspeitosamente alto pode acabar afastando as pessoas.
A suspeita é global
Repetimos esse experimento com empregos diferentes, salários normais diferentes e em países diferentes.
Tanto nos EUA quanto no Irã, apesar de tipos muito diferentes de economia, as pessoas mostraram o mesmo padrão de suspeita e recusaram salários muito altos. A única diferença era que, no Irã, os salários esperados eram menores, então os valores não precisavam ser altos para os padrões dos Estados Unidos para se tornarem desconfiados.
Outro experimento testou como os custos imaginários poderiam afetar as compras de passagens aéreas envolvendo uma escolha hipotética entre três voos.
Um, por US$ 235; outro, por US$ 275 e, a terceira opção, US$ 205. A maioria das pessoas escolheu essa. No entanto, quando foi oferecido por US$15, quase ninguém escolheu o voo mais barato. Rejeitaram porque, supostamente, um valor tão baixo poderia embutir custos horríveis, como terroristas e acidentes de avião.
No entanto, quando demos uma razão para o preço baixo – assentos muito desconfortáveis – a maioria das pessoas preferiu o voo de US$ 15. Assentos desconfortáveis, geralmente, não são um ponto de venda. Mas explicaram o valor barato, então as pessoas não procuraram por outras razões perigosas.
Explicações suficientes para que algo seja um grande negócio eliminam a tendência das pessoas de imaginar custos fantasmas.
Uma boa oferta, não uma oferta suspeita
As empresas enfrentam um ato de equilíbrio quando se trata de oferecer um bom negócio aos clientes.
Por um lado, a expectativa de custos fantasmas diminui o interesse na oferta. Por outro, consumidores sensíveis a preço geralmente buscam maneiras de obter o melhor negócio.
Para evitar desconfianças, as empresas precisam comunicar seus motivos para oferecer um negócio particularmente bom. Uma “liquidação de férias” ou “liquidação de fim de temporada”, por exemplo, pode explicar porque os itens estão com desconto.
No mercado de trabalho, identificar “bom desempenho” como motivo para o aumento salarial de um funcionário pode evitar a expectativa de desvantagens ocultas – como aumento da carga de trabalho.
É claro que as pessoas não são meros seres econômicos interessados em si mesmos. Somos seres psicológicos e experientes, capazes de ler as motivações dos outros para nos proteger de ofertas que parecem boas demais para ser verdade.
*Andrew Vonasch é professor sênior de Psicologia da Universidade de Canterbury.
**Este texto foi publicado originalmente no site da The Conversation Brasil.
Lula participa por videoconferência da reunião dos BRICS, na Rússia