Obra no Pedral do Lourenço tem investimento do PAC e preocupa ambientalistas e pescadores no Pará: ‘Nós e o rio somos um só’

Projeto está na fase de licenciamento ambiental e Dnit diz que foram realizadas audiências públicas sobre o empreendimento. Início das obras está previsto para março de 2024 em Itupiranga. Derrocagem do Pedral do Lourenço preocupa ambietalistas no Pará
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A obra da derrocagem do Pedral do Lourenço, que deve permitir a navegação na extensão dos rios Araguaia e Tocantins, está prestes a sair do papel no Pará. Mas ambientalistas apontam impactos ambientais que a nova hidrovia pode trazer. A derrocagem do Pedral do Lourenço está entre as obras com investimentos previstos no Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
“Com o acesso de mais pessoas à área, o desmatamento vai aumentar e a questão climática vai agravar, o que já está ocorrendo. Se continuarmos a degradar o ambiente, isso só tende a aumentar e, com certeza, vai nos prejudicar também”, afirma o biólogo Diógenes Siqueira, que acompanha a obra.
Pescadores tradicionais da região também estão preocupados, segundo o presidente da Associação das Comunidades Ribeirinhas do Pedral do Lourenço (Acrevita) e morador da Vila Tauiry, Ronaldo Macena.
“Eles mexendo na natureza, eles mexem com a gente. Nós e o rio somos um só. Sem a pesca não conseguimos sobreviver”, afirma.
O início das obras no Pedral está previsto para março de 2024. A obra, que consiste na fragmentação e remoção de rochas ao longo d emais de 30 quilômetros de rios, será para construir a hidrovia Araguaia-Tocantins no município de Itupiranga, no sudeste do Pará.
Obra em Pedral do Lourenço que deve começar em 2024 e causa indignação nos pescadores da região
A expectativa pe que com a obra, a região de Marabá se torne uma dos poucos no Brasil a ter quatro modais logísticos: rodovias, ferrovia, aeroporto e hidroviária.
O projeto está na fase de licenciamento ambiental. Em agosto deste ano, o Governo Federal anunciou que vai investir R$ 75,2 bilhões no Pará, mas não especificou quanto voltados para a derrocagem da área conhecida como Pedral do Lourenço.
Mapas de obras do PAC prevê investimentos na Derrocagem do Pedral do Lourenço
Reprodução governo federal
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Ribeirinhos e ambiente afetados
Há 22 comunidades ribeirinhas espalhadas ao longo do curso do rio Tocantins dependem economicamente do Pedral do Lourenço. A principal atividade é a pesca e a maior parte dos moradores é formada de pescadores, que temem que a obra mude a realidade da população.
Rineirinhos temem ficar sem peixe apos obra no rio Tocantins, no Pará
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Ronaldo Macena diz que a vila onde mora, Vila Tauiry, deve ser uma das mais impactadas com a obra. “O impacto maior vai ser na pesca, mas também nas populações ribeirinhas que fazem parte daqui do Pedral do Lourenço”, diz ele.
“O impacto maior vai ser na pesca, mas também nas populações ribeirinhas que fazem parte daqui do Pedral do Lourenço”, diz ele.
Ele questiona como será a vida da população local com a obra.“Esse Pedral é muito importante para nós. Como vamos pescar, colocar a rede, praticamente o rio vai ser privatizado porque não vamos poder pescar. Hoje, 95% sobrevive da pesca.
No período de cheia, a pesca ocorre com redes espalhadas no curso do rio Tocantins, já durante a seca, a pesca é com anzóis e redes em meio às rochas do Pedral nas corredeiras formadas a partir da queda da vazão do rio.
“Têm dias que a gente vai e pega bem, 50kg, 100kg. Têm dias que não alcança nem o almoço. Fico triste com o que vai acontecer. Meu trabalho é este aqui. Vai tirar nosso trabalho, nosso sustento, dos nossos filhos e netos. Só tristeza e prejuízo”, lamenta o pescador Luzimar Alves.
“O que eu vejo nessa obra é vai beneficiar apenas os empresários, o governo, e as autoridades que nunca pensaram em quem mora aqui na nossa região. Nossa preocupação é com nossos filhos, que foram criados aqui. Saímos de manhã cedo pra ir pescar, 7h da manhã, e voltamos às 17h, com o peixe para comer e aí vamos vivendo. Nós não desejamos sair daqui para outro canto, nem temos condições. Nossa convivência já é aqui, nossas raízes”, relata o pescador, José Ferreira.
O pescador Hernandes Soares acredita que a obra tem benefícios, mas não para a população ribeirinha.
“Quando eles retiram a pedra, criam um impacto. Nós precisamos das pedras, nós não somos contra, mas queremos ser compensados, já que vamos ter prejuízos. É um impacto direto, não precisa nem fazer estudo para entender isto”, comenta.
De acordo com o biólogo Diógenes Siqueira, algumas espécies de peixes correm o risco de extinção por causa da obra.
“Então quando você destrói um substrato que eles usam corriqueiramente, seja para se alimentar ou para se reproduzir, com toda certeza terão espécies que não vão se adaptar ao novo ambiente e possivelmente poderão até ser extintas daquela região, o que levará a população local a ter problemas econômicos”, diz o biólogo.
A agrônoma, professora e pesquisadora dos rios da região, Andrea Hentz, ressalta a importância de uma análise dos impactos, a curto e longo prazos, principalmente na vida da população que vive no entorno do rio Tocantins.
“Mesmo sendo retiradas, indenizadas, levadas para outros lugares, têm seu pertencimento anulado. Os impactos ambientais também são muito graves e muitas vezes irreversíveis”, diz a pesquisadora.
“A vulnerabilidade socioeconômica precisa ser avaliada e essas populações, mesmo sendo indenizadas, no momento que são retiradas dessas áreas, sofrem um impacto porque em todo o rio Tocantins elas têm uma história de vida, um pertencimento com as águas desse rio”, afirma.
Rio Tocantins, em Itupiranga, no Pará
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O projeto prevê escoamento de 20 a 60 milhões de toneladas de carga por ano. O economista Giliad Silva diz que, se de fato a obra sair do papel, a capacidade logística da região será ampliada, o que deve gerar potencial para atividades econômicas.
“Temos problemas sérios com rodovias. Nossas ferrovias, basicamente, tem apenas uma direção e atende apenas um tipo de atividade econômica que é a mineração. As hidrovias têm baixa capacidade de articulação com o sudeste paraense, então, de fato, vamos ter agora uma maior capacidade de articulação logística de uma parte do estado que é o sudeste paraense com as demais partes, e isto deve gerar um grande potencial pra algumas atividades econômicas”, diz o economista.
Em março, o Ministério Público Federal (MPF) chegou a recomendar a suspensão de licença de obra, que teve edital lançado em 2014.
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) informou que o projeto está na fase de licenciamento ambiental e que já foram realizadas cinco audiências públicas sobre o empreendimento.
As audiências foram conduzidas pelo empreendedor em colaboração com o Ibama e a empresa contratada para realizar os estudos e projetos. O g1 também pediu informações ao Ibama, mas não obteve retorno.
Pedral do Lourenço será explodido para dar lugar à hidrovia
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