
Especialistas afirmam que a atual política de gastos do governo pode comprometer o crescimento sustentável. A economia brasileira cresceu 3,4% em 2024, o melhor resultado desde 2021. Mas o ritmo começou a desacelerar no último trimestre do ano, e acendeu um sinal de alerta.
Centro do Rio de Janeiro, meio-dia. A aposentada Elisete de Sousa vai às compras:
“Se eu não posso comprar isso, eu posso substituir com outra coisa que faça a mesma qualidade daquilo que vai fazer por um preço menor”, diz.
A dona do quiosque de eletrônicos tem trabalho:
“Celular quebra, a gente tem que trocar película, a gente tem que trocar tela. Aqui, você encontra tudo”, diz a comerciante Márcia Rebelo.
O movimento dos restaurantes aumentou.
“Não dá para ficar sem almoçar. Seja arroz e feijão, temos diversas opções aqui no prédio”, conta o comerciante Arthur Lowenhaar.
As lojas ociosas já não são tantas.
“Nós entramos o ano de 2024 chorando, porque nós estávamos com só 10% de ocupação. No decorrer do ano, com a evolução dessa região do Centro, a gente chegou a quase 70% de ocupação. Quer dizer, as coisas melhoraram muito”, afirma Cláudio André de Castro, diretor de imobiliária.
PIB
Jornal Nacional/ Reprodução
Esse ciclo representa bem o que aconteceu na economia brasileira em 2024. O consumo das famílias cresceu, impulsionou o setor de serviços – um dos mais importantes porque emprega muita gente. E esse foi o motor do crescimento econômico que fechou o ano em alta de 3,4%. Foi o melhor resultado desde 2021, ano de recuperação depois da pandemia.
O PIB é o Produto Interno Bruto – o conjunto de todos os bens e serviços produzidos pelo país em um ano. Um ranking com 64 países mostra o crescimento em 2024: o Brasil aparece em 20º lugar, na frente da Coreia do Sul, Canadá e México.
“A gente já tem um mercado de trabalho aquecido. A gente está com taxas mínimas históricas da taxa de desemprego, e a gente tem um setor de serviços muito forte. Tudo está muito alinhado, é o setor que mais emprega na economia vindo muito forte e puxando esse crescimento”, explica Juliana Trece, economista FGV IBRE.
Os programas de transferência de renda do governo também contribuíram para esse aumento do consumo das famílias. As despesas do governo também aumentaram. Outro setor produtivo importante, a indústria, cresceu 3,3%.
Só a agropecuária registrou queda. O número não é tão preocupante porque a base de comparação é alta, já que em 2023 a agropecuária deu um salto de 16% puxada pela safra recorde. Em 2024, efeitos climáticos impactaram várias culturas, como a soja e o milho.
Economia brasileira cresce 3,4% em 2024, melhor resultado desde 2021
Jornal Nacional/ Reprodução
O Brasil conseguiu aumentar as exportações de bens e serviços, e as importações subiram bem mais: quase 15%. Entre os destaques das compras que vieram de fora estão produtos químicos, máquinas, aparelhos elétricos e equipamentos. E, com isso, o país aumentou também os investimentos. Em uma rede social, o presidente Lula comentou o resultado:
“PIB crescendo é mais emprego e renda na mão dos brasileiros e das brasileiras. 2025 é o ano da colheita”.
Economistas alertam que o crescimento econômico ainda é muito focado no consumo.
“A gente está crescendo muito via consumo, via demanda, e a nossa capacidade produtiva não está conseguindo acompanhar. O Brasil tem muita dificuldade em ter uma taxa de investimento alta e conseguir manter um ritmo de crescimento capaz de acompanhar esse aumento da demanda. Então, isso acaba gerando uma pressão inflacionária que faz com que o Banco Central aumente os juros. Quando a gente tem esse aumento dos juros, a gente tem reflexo na economia brasileira”, afirma a economista Juliana Trece,.
“Com o aumento da inflação, foi necessária a subida da taxa de juros. O investimento precisa, realmente, de uma taxa de juros mais baixa para poder crescer. E, ao mesmo tempo, menor incerteza na economia. O Brasil hoje está sofrendo com essa incerteza sobre a política fiscal. Isso vai prejudicar os investimentos também esse ano”, diz Silvia Matos, economista FGV Ibre.
Essa desaceleração já apareceu no quarto trimestre – e foi ligeiramente maior do que a esperada. O crescimento da economia ficou concentrado nos primeiros meses do ano. No quarto trimestre, o PIB foi praticamente estável. Uma mudança de rota que liga o sinal de alerta. Segundo economistas, a atual política de gasto público pode comprometer um resultado mais sustentável da atividade econômica.
“Parece que o crescimento do ano passado realmente foi bom do ponto de vista do investimento, mas ainda está faltando melhor eficiência na economia. E a gente só vai poder crescer de uma maneira sustentável, sem gerar inflação – acho que esse é o principal ponto – é com o aumento da capacidade produtiva. Mas é só com o aumento da produtividade e do investimento que a gente consegue esse resultado. E não é fácil, não tem atalhos e saídas fáceis para crescimento sustentável”, afirma a economista Silvia Matos.
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