
Uma das mais curiosos exércitos do mundo é com certeza a Guarda Suíça, que tem como função, desde o início do século XVI, cuidar da segurança do Vaticano e do papa, como o novo pontífice Leão XIV.
O cardeal norte-americano Robert Prevost foi eleito papa nesta quinta-feira (8), ao final do conclave iniciado na véspera, e adotará o nome de Leão XIV. Com isso, o “exército” do Vaticano tem novamente quem guardar.
Origem e exigências
Criada em 1506, a Guarda Suíça Pontifícia permanece como a menor e mais antiga força armada profissional em operação. Instituída por ordem do papa Júlio II, o grupo é responsável pela proteção do chefe da Igreja Católica e do território soberano do Vaticano.
Estão nas atribuições da guarda fazer a vigilância, controle de acesso e escolta em eventos e deslocamentos oficiais.
A corporação é composta exclusivamente por cidadãos suíços, com idade entre 19 e 30 anos, católicos praticantes, solteiros, e com formação militar obrigatória concluída na Suíça.
O compromisso inicial exige permanência mínima de 26 meses no serviço. A hierarquia prevê progressão interna e, em casos específicos, autorização para casamento mediante critérios temporais e funcionais.
Em estimativas mais recentes, o contingente atual conta com 119 integrantes: cinco oficiais, 26 sargentos e cabos, e 78 soldados.
A língua oficial da instituição é o alemão. O lema permanece em latim: Acriter et fideliter (“Com coragem e fidelidade”).
Afazeres curiosos e formação
Com base no território da Cidade do Vaticano, os soldados mantêm postos fixos em locais como a Praça de São Pedro e o Palácio Apostólico.
Em cerimônias públicas, utilizam o uniforme de gala, com cores inspiradas no período renascentista. Em ações de segurança moderna, atuam à paisana, armados com equipamentos letais e dispositivos de comunicação.
A formação inicial ocorre na Suíça, em Isone, com treinamento em armamento, primeiros socorros, psicologia, direito e protocolos de defesa.
A segunda etapa é conduzida no Vaticano, com foco em cerimonial, idioma italiano, postura diplomática e uso da alabarda — arma de haste tradicional do grupo.
“Sacrificando, se necessário, até mesmo a minha vida em sua defesa”
O vínculo entre soldados suíços e a Santa Sé antecede a fundação da corporação. Desde o século XIV, combatentes helvéticos atuavam como mercenários em conflitos europeus e haviam sido recrutados por diversos papas, afirmam documentos históricos.
Em 22 de janeiro de 1506, chegou ao Vaticano o primeiro contingente oficial da Guarda Suíça. Composto por 150 homens, o grupo foi liderado por Kaspar von Silenen.

A incorporação se consolidou com o apoio financeiro do banqueiro Jakob Fugger, aliado estratégico do papado à época.
O episódio mais decisivo ocorreu em 6 de maio de 1527, durante o Saque de Roma, quando tropas do imperador Carlos V invadiram a cidade. Na ocasião, 147 dos 189 soldados da Guarda morreram para permitir a fuga do papa Clemente VII até o Castelo de Santo Ângelo.
Desde então, a data marca o juramento anual dos novos integrantes da corporação.
“Juro servir fielmente, lealmente e honradamente o Pontífice reinante e seus legítimos sucessores… sacrificando, se necessário, até mesmo a minha vida em sua defesa.” — Trecho do juramento da Guarda Suíça
Vestimentas e acessórios
Após o atentado contra João Paulo II, em 1981, o Vaticano incorporou estratégias de defesa mais modernas. A guarda passou a empregar armas de fogo em escoltas discretas e integrar protocolos de segurança preventiva em viagens internacionais.
Com presença constante em eventos litúrgicos e recepções de Estado, os soldados se tornaram também símbolo visual da diplomacia vaticana.

O uniforme cerimonial, redesenhado em 1914 pelo comandante Jules Répond, segue o modelo renascentista atribuído a Michelangelo, embora não haja comprovação documental da autoria.
A indumentária inclui túnica de cetim listrada em azul, vermelho e amarelo, capacete com pluma e luvas brancas. Em ocasiões solenes, são utilizadas armaduras do século XVII; nos turnos noturnos, prevalece o uniforme azul de patrulha.
Função durante a Sé Vacante
Além da proteção diária ao papa, a Guarda atua em períodos de transição do poder pontifício. Durante a chamada Sé Vacante, quando há ausência de pontífice por morte ou renúncia, os soldados são responsáveis pela segurança do Colégio de Cardeais reunido no conclave.
Esse protocolo foi novamente acionado com a morte do papa Francisco, aos 88 anos, confirmada pelo Vaticano em 21 de abril. No velório, guardas suíços permanecem posicionados junto ao caixão, em função de honra e proteção simbólica.
Contrato, remuneração e rotina
Os guardas assinam contrato de dois anos, com salário mensal de 1.200 euros. O alojamento é realizado na caserna do Vaticano. Dormir fora do território é proibido, salvo autorização expressa.
Além das funções operacionais, os integrantes participam de celebrações litúrgicas, mantêm equipe de futebol, banda militar e grupos culturais próprios. A corporação conta com capelão e capela interna.
O comandante atual é Christoph Graf, natural de Lucerna, no cargo desde 2015.