Sobrevivente de naufrágio é dada como morta em ação contra comandante da lancha que afundou deixando 23 mortos no Pará


Parada na Justiça, a ação do MP segue sem data para audiência de instrução e julgamento do comandante Marcos de Souza Oliveira por ‘falta de informações sobre as vítimas’. O g1 apurou que 16 delas sequer aparecem nos autos da denúncia apresentada à Justiça. Naufrágio em Cotijuba
Divulgação / Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social
Oito meses após o naufrágio da lancha Dona Lourdes II no Pará, um processo se arrasta para imputar a responsabilidade pelas 23 mortes. Uma audiência de instrução e julgamento do comandante da embarcação foi adiada no último dia 2 de maio e agora segue sem nova data. O motivo do imbróglio é a ausência de informações sobre as vítimas, segundo o próprio Ministério Público do Pará (MPPA).
O g1 apurou que um dos sobreviventes foi dado como morto e que, dos 23 mortos, dezesseis vítimas não tiveram laudo de morte anexado na ação contra o comandante Marcos de Souza Oliveira. As brechas na investigação constam na denúncia apresentada pelo promotor Edson Augusto Cardoso de Souza à Justiça.
O MPPA informou, por meio da Promotoria de Justiça do Tribunal do Júri, que “foi pedido o adiamento da audiência por conta da falta de documentos das vítimas e dos sobreviventes visto que não há como o processo seguir sem a identificação das pessoas”.
O órgão orienta que “novas testemunhas e familiares sejam incorporados ao processo, após entrar em contato com a Polícia Civil e a informação chegar ao MPPA”.
Enquanto isso, a lancha, que foi retirada do rio sem autorização e sem passar por perícia, está desaparecida. O comandante Marcos de Souza Oliveira está em liberdade, por determinação da Justiça. Antes de ter sido preso, ele chegou a postar vídeo em rede social. A defesa de Marcos não havia se manifestado até a publicação da reportagem.
Diante da inércia, familiares de vítimas que morreram e sobreviventes iniciaram uma busca por novas testemunhas para compor a lista de todos que estavam na lancha, a fim de mobilizar novas testemunhas a entrarem no caso.
Quem são os mortos?
Da lista de mortos no naufrágio, apenas 8 pessoas estão citadas na denúncia do MP, sendo que uma está viva – veja na lista:
Idelerme José Pereira Pamplona (vítima morta)
Enzo Guilherme Silva Souza (vítima morta)
Gabriele Franklin dos Santos Lopes (vítima morta)
Hayane Franklyn dos Santos Lopes (vítima morta)
José Luis Rodrigues da Silva (vítima morta)
Maria América Pantoja (vítima morta)
Brenda Nayara Seabra Oliveira (vítima morta)
Diva Assunção Leal Seabra Oliveira (vítima sobrevivente, dada como morta)
Outros 16 nomes de vítimas mortas, levantados pelos próprios sobreviventes, não constam nos autos do processo, são eles:
Ananda Luíza Barreto Da Silva
Dalva Tereza Batalha Cabral
Edinéia Carneiro Campos
Erzeli Maria Dos Santos
Guilherme Vasconcelos Assunção
Izidoria Barbosa Assunção
Jameson Márcio Pimentel De Souza
Lídia Valentim Favacho
Lívia Vitória Oliveira Seabra
Maria Da Conceição Alcantara Leal
Maria Da Conceição Clemente Da Silva
Maria De Fátima Do Nascimento Conceição
Marília Gonçalves De Souza
Sebastião Ferreira Pacheco
Sival Lopes Da Costa
Sofhia Loren Andrade Dos Santos
Ainda não se sabe o motivo dos laudos cadavéricos ainda não terem sido anexados à denúncia.
Segundo familiar de uma vítima, ouvida pelo g1, ao liberar o corpo do parente, foi feita identificação junto ao Instituto Médico Legal (IML), entregue o laudo, mas a pessoa afirma não ter sido chamada para depor na delegacia. Ela não soube informar se outras famílias também não foram orientadas.
A denúncia
Segundo o MP, a embarcação saiu do porto do Camarazinho, em Cachoeira do Arari, na ilha do Marajó, e naufragou com mais de 50 passageiros. Ao menos 80 pessoas estavam na embarcação, segundo os próprios sobreviventes.
A denúncia aponta que a lancha passou já superlotada por outros dois portos, onde mais passageiros subiam, sob protesto dos passageiros que já estavam na embarcação.
O MP ainda traz relatos de passageiros, afirmando que, na hora do naufrágio, tentaram pegar coletes, porém Marcos de Souza Oliveira teria dito que não havia necessidade.
Em outros depoimentos, vítimas apontaram que Marcos teria ligado para a mãe, proprietária da lancha, em vez da Capitania dos Portos. Ainda segundo os relatos, não havia coletes suficientes salva-vidas para todos.
O MP conclui defendendo que Marcos seja julgado por homicídio doloso, já teria assumido o risco de produzir várias mortes ao planejar e conduzir a viagem.
Entre as conclusões do MP estão que:
a embarcação operava de forma clandestina;
equipamentos de segurança, como os coletes, estavam irregulares;
responsável não orientou passageiros no momento do naufrágio;
número de passageiros estava sem controle, já que não havia lista.
Cartaz no protesto que pede Justiça pelas vítimas do naufrágio que ocorreu em setembro de 2022, em Cotijuba.
Reprodução / TJPA
O naufrágio
A embarcação Dona Lourdes II saiu da ilha de Marajó para a capital paraense, no dia oito de setembro de 2022 com mais de 80 passageiros. O barco afundou perto da Ilha de Cotijuba e matou 23 pessoas.
O veículo não tinha autorização para navegar e partiu de um porto clandestino. Também não havia lista oficial de passageiros, segundo a Secretaria de Segurança do Pará (Segup).
Após naufrágio na região de Belém, praia na Ilha de Cotijuba estava sendo usada para receber resgatados nesta quinta-feira
Redes sociais/Reprodução
Muitos sobreviventes relataram que o condutor da embarcação é o maior culpado por ter demorado a chamar socorro quando o barco começou a afundar, além de não orientar os passageiros e não distribuir os coletes salva-vidas.
Sobreviventes apontaram que os salva-vidas não teriam condições de uso — muitos se rasgavam. Alguns pescadores que ajudaram no resgate encontraram pessoas já sem vida com colete.
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